Olá, me chamo Joni.
João Silva na certidão. Sou detetive particular. Quer dizer,
sobrevivo assim. Meu escritório ao menos tem uma placa na porta com
a inscrição “Joni – Detetive Particular”.
Vivo de tirar fotos de
maridos traidores para esposas traídas. Não é exatamente como eu
sonhava mas paga uma parte das minhas contas. A outra parte está
atrasada.
Dezembro não é um mês
bom para mim. É época de reconciliação, então ninguém quer se
separar e por isto ninguém me procura para provar que está sendo
traído.
Mas este ano algo
diferente aconteceu. Deve ser a tal magia do natal.
Na tarde do dia 24 de
dezembro bateram em minha porta. Abri-la e dei de cara com 12
pequenos anões. Eles estavam com uma roupa estranha e expressões
bem assustadas.O senhor é o Joni? - - - Detetive particular?
Antes de respirar para
responder eles falaram em uníssono:
- Papai Noel sumiu!!!!
Imaginem meus amigos a
minha cara de espanto. Para mim o natal sempre foi uma data como
outra qualquer. Quando pequeno armava presépio e ajuda minha mãe a
arrumar a arvore. Mas os anos se passaram e perdi o encanto.
Agora estou com doze
pequenos seres assustados me pedindo ajuda para encontrar o papai
noel e salvar o natal de milhões de criancinhas em todo o mundo!
Segundo as informações
que eles me passaram, papai noel veio até o Rio de Janeiro para
visitar uma de suas fábricas de brinquedos e sumiu.
Logo quando os
pequeninos saíram da minha sala comecei a raciocinar. Se eu fosse
Papai Noel, onde eu estaria? Ou se eu quisesse dar um sumiço no
Papai Noel quem eu seria?
Talvez eu fosse o
coelho da páscoa, enciumado pelo sucesso do bom velhinho? Ou talvez
eu fosse dono de uma fábrica de brinquedos, que veria a fábrica de
brinquedos natalina como uma grande concorrente? Talvez um primo
distante, arrasado pelo sucesso do parente?
Eu tinha apenas uma
certeza. Teria que ir até o submundo carioca para ter alguma
informação.
Peguei o meu chapéu e
fui direto ao largo da carioca. Lá eu encontraria o Chico Beiço,
meu informante mais assertivo.
Não foi difícil
encontra-lo. Estava no local habitual. A banca de revistas.
Conversamos rapidamente
e ele mencionou que havia escutado sim algo a respeito. Me indicou
subir o Morro da Manqueira e procurar pelo Luiz Gama, e que eu
pudesse falar no nome dele.
A pista estava
esquentando. Peguei uma condução logo em frente a banca e fui
direto para a Manqueira.
Passavam pouco das 4 da
tarde quando comecei a subida do morro. Tinha que me apressar. Logo
escureceria e o natal estaria perdido.
Na subida entre as
casas humildes vi muita movimentação. Um sobe e desce frenético.
Antes de chegar a casa indicada pelo Beiço vi um cartaz chamando as
crianças e suas famílias para um jantar comunitário na quadra da
escola de samba.
Reconhecer o Luiz não
foi difícil. Sentando em frente a casa rosa com portas verdes ele só
acompanhava com os olhos a movimentação da comunidade.
Muito solicito o Luiz
me despachou, dizendo não saber onde eu poderia encontrar o velho
Noel.
Alguma coisa não me
parecia certo, e enquanto descia o morro pude notar dois rapazes,
grandes, estilo guarda roupa, me seguindo.
Continuei descendo e
entrei em uma condução, deixando pra trás os dois satisfeitos
guarda costas que subiam o morro.
Meu relógio apontava
18:30 quando eu comecei a subir novamente o morro da mangueira. Boné
enterrado na cabeça, bermuda surfista e uma camiseta da GRES Estação
Primeira de Mangueira – Carnaval 1992. Fui subindo e tomei o rumo
da quadra da escola, para onde os meus instintos me indicavam a
direção. Ao me aproximar pela lateral pude notar os dois rapazes
que me seguiram mais cedo e tive então a certeza de que encontraria
ali o Papai Noel.
Peguei a direção do
fundo do barracão até encontrar uma porta. Com um pouco de jeito e
um pedaço de arame que estava no chão entrei em um comodo escuro.
Segui um filete de luz que vinha por baixo de uma porta. Com muito
cuidado abri a porta e me deparei com uma cena inacreditável.
O bom velhinho
encontrava-se ao redor de uma mesa, junto ao Luiz Beiço e mais uma
dezena de pessoas.
Eu precisava chegar
mais perto para entender o que acontecia naquele local, mas um pé
desajeitado e imprudente acabou colidindo com uma lata de tinta
esquecida em um canto. Simultaneamente todos os integrantes daquela
estranha reunião olharam para trás e entreolharam-se.
Para minha surpresa
suas expressões não eram de raiva, e sim de temor e surpresa.
Apressando-se a frente do grupo o Luiz veio em minha direção com
olhar aflito:
- Não é nada disto
do que você está pensando. Carlos Noel é um grande amigo de
infância que está nos dando uma consultoria de natal.
- O que é isto eu
realmente não sei, mas fui contratado pelos ajudantes deste homem
para encontra-lo. E não vou perder minha viagem até aqui. Faltam
poucas horas para o Natal e ele deveria estar se preparando para sua
jornada natalina.
Após se entreolharam,
foi o homem de barbas brancas e roupas vermelhas que veio a frente.
- Eu nasci nesta
comunidade há muitos anos atrás. Vivi muita coisa aqui, quase
passei fome, trabalhei como aviãozinho do tráfico de drogas e
graças a ajuda do Beiço sobrevivi. Ele me arrumou trabalho na
fábrica secreta de Papai Noel, e após muita dedicação e trabalho
duro fui subindo na empresa até chegar ao cargo máximo, que é o de
Papai Noel. Tinha uma dívida de gratidão com esta comunidade, e
após um contato com o Luiz resolvi ajuda-lo a organizar o natal
deste ano. Não queria que ninguém se preocupasse, quanto mais meus
pequeninos. Mas não tinha outra escolha. Agora que finalizamos a
nossa organização o Luiz, este meu grande amigo irá se vestir como
eu e fazer a alegria destas crianças tão sofridas desta comunidade.
Vendo a minha cara de
confusão, o bom Noel apressou-se a me esclarecer.
- Meu nome é Cartola
Noel. Meu pai era amigo do Cartola, grande compositor mangueirense e
fã de carteirinha de Noel Rosa. Por isto me chamam de Papai Noel.
Como eu existem diversos Papais Noeis. Alguns não tem este nome em
sua identidade, mas todos temos em nossos corações a alegria de
cumprir a nossa missão, levar magia a todos os corações.
Mais do que isto não
posso explicar porque como você já sabe, posso me atrasar para
entregar os presentes das outras crianças. Olha lá. Quem vejo
subindo o morro? Meus ajudantes...
- Fui eu quem os
trouxe aqui. Tinha certeza de que o encontraria aqui. - exclareci
rapidamente.
Acompanhado pelos seus
ajudantes o Sr. Cartola Noel tomou seu caminho em direção a um
feliz natal!